Amigos da Terra – Amazônia Brasileira participa de webinar: O papel da mídia e das organizações da sociedade civil na formação das percepções do público sobre iniciativas livres de desmatamento no Brasil e na Alemanha
O dia 5 de setembro é dedicado à celebração da maior floresta tropical do planeta, a Floresta Amazônica. Para promover o debate sobre o desenvolvimento sustentável da região amazônica e fomentar o diálogo entre as partes interessadas do Brasil e da Alemanha, a Embaixada do Brasil em Berlim organizou uma série de eventos. A “Amazonas Woche” realizou-se entre os dias 11 e 15 de Setembro. Veja a programação aqui.
A Amigos da Terra – Amazônia Brasileira, em colaboração com a Climate & Company e o apoio da BRASFI – Aliança Brasileira de Finanças e Investimentos Sustentáveis, realizou dois webinars que foram organizados no âmbito de um projeto financiado pelo Betty and Gordon Moore Foundation. Ao envolver especialistas do Brasil e da Alemanha, estes webinars facilitaram discussões bilaterais significativas e a troca de ideias relacionadas com (1) promoção da cadeia pecuária sustentável e (2) o papel desempenhado pela mídia e pelas organizações da sociedade civil na formação da perceção pública do desmatamento.
As principais conclusões do painel “O papel da mídia e das organizações da sociedade civil na formação das percepções do público sobre iniciativas livres de desmatamento no Brasil e na Alemanha” são apresentados a seguir:
- Os riscos econômicos associados ao desmatametno e à perda de biodiversidade devem ser mais explorados pela mídia nas secções de notícias econômicas e financeiras;
- O Brasil está politicamente dividido e isso afeta a perceção das notícias pelo público em geral;
- As fakenews são um desafio contemporâneo que afeta a cobertura da mídia sobre o desmatamento. A comunicação é fundamental para combater as fakenews;
- A mídia aborda as caudas do desmatamento de forma pouco aprofundada, o que é essencial para uma abordagem holística no combate ao desmatamento;
- Ainda existem dúvidas sobre a implementação e atendimento ao EUDR, principalmente sobre a forma como os pequenos produtores são afetados, o que deve ser abordado na mídia para que o Brasil atenda o EUDR;
- As ONG desempenham um papel importante na construção de pontes entre as comunidades e no fornecimento de dados confiáveis;
- A mídia deve ser mais criativa para reduzir a complexidade inerente ao tema da cobertura do desmatamento e da EUDR para que a informação chegue à sociedade em geral.
Este webinar foi realizado no dia 14 de setembro e teve como objetivo promover uma discussão sobre o papel que a cobertura da mídia desempenha na formação da percepção pública sobre iniciativas livres de desmatamento no Brasil e na Alemanha. Diferentes políticas para reduzir o desmatamento foram aprovadas recentemente no Brasil e na União Europeia. A forma como estas iniciativas são retratadas nos meios de comunicação dos respectivos países desempenha um papel crucial na implementação bem sucedida destas diferentes políticas. Neste painel, estiveram presentes:
- Daniela Chiaretti – Jornalista, Valor Econômico S/A , Brasil
- Susanne Bergius – Jornalista, Alemanha
- Mauro Armelin, – Amigos da Terra – Amazônia Brasileira
- Nicole Polsterer – ONG Fern
- Javier Ortiz Bahamón – Tropical Forest Alliance
O painel foi moderado por Catharina Vale, senior external advisor at Climate & Company. consultora externa sênior da Climate & Company.
A primeira pergunta questionou as perspectivas dos painelistas sobre como o Brasil tem sido retratado na mídia em relação ao desmatamento.
A perspectiva dos especialistas da UE:
As reportagens da mídia sobre o desmatamento na América Latina são robustas e mostraram melhorias significativas em termos de cobertura nos últimos 15 anos. Embora a mídia reporte sobre o desmatamento em uma perspectiva internacional, uma parte significativa desta cobertura concentra-se no Brasil (que detém 60% da Amazônia), enquanto outros países da bacia amazônica e outros biomas brasileiros não estão bem cobertos. Faltam análises aprofundadas e informações detalhadas nas reportagens publicadas pela mídia. Embora as causas do desmatamento sejam discutidas,, a mpidia muitas vezes não aborda as suas causas com a profundidade necessária para uma abordagem abrangente de combate ao desmatamento. Em referência ao EUDR, observam-se respostas críticas do Brasil em relação ao unilateralismo da UE, bem como narrativas alarmistas de empresas e partes interessadas, que criam uma imagem crítica para ambos os lados.
A perspectiva dos especialistas do Brasil:
Nos últimos quatro anos, houve uma orientação política em direção ao desmatamento como promotor de crescimento, e esse entendimento é um grande desafio que o Brasil ainda enfrenta. Embora o desmatamento na Amazônia tenha sido reduzido sob a gestão do atual governo, ainda são necessárias muitas ações. Algumas pessoas acreditam que o desmatamento já foi resolvido, o que não é verdade. A mídia desempenha um papel importante na educação do público sobre os impactos de longo prazo do desmatamento, incluindo seus efeitos sobre as chuvas e os recursos hídricos, e suas possíveis consequências para a agricultura brasileira.
A perspectiva das jornalistas:
Na UE e na Alemanha, os jornalistas climáticos têm coberto cada vez mais o desmatamento, mas geralmente em páginas voltadas a temas ambientais e de entretenimento misto, com menos cobertura nas seções voltadas a política e economia. A ligação entre as crises de biodiversidade e a importância das florestas na Amazônia/Cerrado e em outros biomas do mundo não está bem explicada. Os jornalistas financeiros e econômicos normalmente não relatam a relevância destes biomas para o comércio ou para as instituições financeiras. Na mídia da UE e da Alemanha, observa-se que o Brasil está polarizado, dividido em dois blocos políticos, com opiniões muito diferentes sobre o desmatamento, a natureza e o papel que as empresas e os negócios desempenham em relação a ele.
No Brasil, houve uma mudança notável na cobertura da Amazônia durante a gestão do presidente anterior. A mídia tradicional e alternativa dedicada às questões socioambientais passou a reportar o desmatamento da Amazônia a partir de dados oficiais, divulgando atualizações semanais sobre o assunto. O aumento das taxas de desmatamento despertou preocupações entre os cidadãos, principalmente das regiões Sul e Sudeste, num movimento que não era esperado. Devido às altas taxas de desmatamento, a região amazônica assumiu um papel político que não ocupava anteriormente. A reputação do Brasil foi manchada, o que criou uma enorme sensibilidade na economia. Observou-se um movimento internacional, principalmente no Reino Unido e na UE, onde varejistas e clientes afirmaram que não comprariam produtos ligados a desmatamento.
Numa segunda rodada de perguntas, Catharina perguntou aos painelistas como a sociedade civil pode contribuir para melhorar a cobertura do desmatamento na mídia.
A perspectiva das jornalistas:
Há muita desinformação, principalmente em relação à Floresta Amazônica. A floresta tropical é enorme e muito diversa e a maioria dos jornalistas e da sociedade nunca esteve lá. Ao considerar o EUDR, precisamos compreender melhor este regulamento e como os pequenos produtores são afetados. Nesse sentido, as ONGs podem desempenhar um papel vital no esclarecimento de como sua implementação pode ou não ter efeitos sociais adversos no Brasil.
Uma recente declaração do Itamaraty, assinada por 17 países, expressou suas preocupações em relação ao EUDR. As ONG devem deixar clara a dependência da economia mundial da natureza e da biodiversidade, tal como os jornalistas políticos, econômicos e financeiros devem explorar este tópico. O mundo se desenvolveu devido à floresta, porém não existe um modelo econômico para conviver com florestas em pé. São necessárias ONGs e institutos para apoiar o Brasil no desenvolvimento da Amazônia e acabar com a pobreza e a desigualdade.
A perspectiva dos especialistas do Brasil:
Os especialistas precisam parar de falar sozinhos e se comunicar de maneira adequada. Muitas vezes, não falam em público e a mídia deve traduzir números e termos técnicos para um público mais vasto. Há necessidade de educar os consumidores para perceberem os atributos dos produtos e capacitá-los para exigirem produtos livres de desmatamento, ou seja: poder do consumidor traduzido em ação.
A perspectiva dos especialistas da UE:
É crucial que os indivíduos, incluindo os povos indígenas e os agricultores, tenham a sua voz respeitada. A mídia desempenha um papel vital na humanização de suas histórias, retratando seus desafios e possíveis soluções. Embora as ONG enfrentem inúmeras exigências, não conseguem fazer com que a mudança aconteça sozinhas. As ONG podem apoiar falando com as pessoas no campo, dando acesso a estas vozes, construindo pontes além de poder ajudar com o fornecimento de dados.
As ONG deveriam trazer para a discussão um modelo de desenvolvimento econômico. A comunidade global, em geral, parece não ter a profunda preocupação e consciência necessárias para iniciar mudanças fundamentais no nosso consumismo e no nosso quadro econômico. No entanto, não há financiamento suficiente para realmente analisar estas questões em profundidade.
Na terceira e última ronda de perguntas, os painelistas apresentaram os seus pontos de vista sobre o que poderia ser feito para melhorar a compreensão do EUDR e de outra legislação semelhante.
A perspectiva dos especialistas da UE:
Precisamos de ser muito mais criativos se quisermos mudar a mentalidade da sociedade. Utilizar vozes de pessoas que realmente tocam o coração da sociedade, reduzindo a complexidade dos dados, por exemplo, utilizando vozes de músicos e artistas para traduzir a ciência de uma forma mais inteligível. Para consolidar a mudança, uma abordagem ascendente é muito útil. O EUDR é uma enorme oportunidade para os brasileiros estarem à frente dos concorrentes e a mídia deveria explorá-la. Outro ponto importante a ser coberto pela mídia é que a UE não é o único bloco comercial a desenvolver tal legislação, visto que a tendência para produtos sustentáveis está definitivamente presente a nível mundial.
A perspectiva das jornalistas:
Ainda existem muitas dúvidas sobre o EUDR no Brasil, evidenciando a necessidade premente de informações mais abrangentes. O EUDR é uma abordagem sistêmica e é importante chegar não só às partes interessadas e aos produtores, mas também aos tomadores de decisão e aos consumidores. É necessário compreender os benefícios para os agricultores/produtores que fazem o seu melhor pela sustentabilidade, pois agora, fazer o que está errado é mais barato e mais fácil. É necessário apoiar e cooperar com os pequenos agricultores para cumprir o EUDR e para formar exportadores e compradores sobre o EUDR.