Estudo revela os avanços dos 10 anos do TAC na sustentabilidade da carne
Amigos da Terra – Amazônia Brasileira revisou o trabalho de auditorias em 10 plantas frigoríficas que se comprometeram em reduzir a compra de animais de propriedades com áreas desmatadas ilegalmente.
É possível diminuir o desmatamento na Amazônia? A Amigos da Terra – Amazônia Brasileira está lançando o estudo “10 anos TAC da Carne no Pará e Compromisso Público da Pecuária: a importância da rastreabilidade da carne na redução dos desmatamentos na Amazônia”. Desenvolvido em 2019, a pesquisa mostra o quão importante é o papel dos frigoríficos e empresas de geomonitoramento para os esforços de redução do desmatamento.
Três motivações levaram a Amigos da Terra a preparar esse estudo: mostrar o que funcionou ou não ao longo dos 10 anos da aplicação do Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) e do Compromisso Público da Pecuária (CPP) para que esses instrumentos não caiam no esquecimento; diferenciar as auditorias do TAC e do CPP, cujo emprego de metodologias, amostragens e ferramentas distintas pode levar, em alguns casos, a resultados completamente divergentes; e, por fim, deixar claro que o desempenho dos frigoríficos também está ligado ao desempenho dos prestadores de serviços de geomonitoramento.
O Estado do Pará possui um total de 45 plantas frigoríficas e/ou exportadoras de animais vivos, das quais 32 são signatárias do TAC da Carne. O presente estudo analisa dados dos 10 frigoríficos signatários mais relevantes para o setor (com números de abates iguais ou superiores a 50 mil animais nos anos de 2016 e 2017), e os resultados do monitoramento da origem do gado levantados pelas auditorias realizadas nesses frigoríficos, no período de 2017 e 2018, a fim de avaliar o cumprimento de suas respectivas exigências.
Resultados do TAC nas auditorias de 2017 e 2018

“Observou-se que o TAC, por envolver um maior número de frigoríficos e ter uma metodologia de auditoria mais robusta, apresenta resultados mais efetivos e confiáveis com relação ao cumprimento de seus termos, sobretudo considerando que o Ministério Público Federal (MPF) conduz um processo de revisão e discussão dos dados antes de serem validados e publicados, diferentemente do que ocorre com o CPP. Porém, os dois compromissos precisam de atualização para que sejam capazes de gerar um impacto efetivo na redução do desmatamento na Amazônia”, explica o diretor da Amigos da Terra, Mauro Armelin.
Para Armelin, “esses compromissos ainda apresentam algumas limitações em sua eficácia no combate ao desmatamento. Por só monitorarem a última propriedade pela qual o animal passou (fornecedor direto), os frigoríficos ainda estão sujeitos a comprar animais que passaram parte de sua vida em propriedades com desmatamento e outras irregularidades socioambientais”.
Após dez anos de existência do TAC e do Compromisso Público da Pecuária para a contenção do desmatamento e das injustiças sociais, segundo Armelin, “o aprendizado é que somente protocolos e/ou acordos escritos não garantem os resultados que se propõem a atingir. Para tanto, é preciso ferramentas robustas com o intuito de monitorar e avaliar sua aplicação e também de aferir resultados para que as adaptações necessárias à melhoria contínua das práticas empresariais continuem avançando”.

Como pode ser observado na tabela, houve uma redução no volume total de animais inconformes em 2018. Na auditoria de 2017, que considerou os abates de 2016, pode-se perceber que de um total de 2,08 milhões de animais auditados, 194,1 mil bois estavam irregulares. Já na auditoria de 2018, que considerou os abates de 2017, dos 2,14 milhões de animais auditados, 101,9 mil foram considerados irregulares.
No entanto, essa redução pode ter sido consequência da alteração na metodologia de amostragem na auditoria de 2018. De acordo com Armelin “Apesar da aparente redução no número de animais irregulares de um ano para o outro, é importante destacar que quem ficou dentro de uma margem considerada satisfatória pelo MPF em 2017, ganhou a possibilidade de reduzir a amostra em 2018. Na tabela, fica evidente que alguns se utilizaram dessa possibilidade, enquanto outros, por confiarem em sua política de compras, continuaram com 100% de análise das operações”.
Por outro lado, Pedro Carvalho Burnier acredita que “em alguns casos pode ter havido uma alteração dos critérios de compras do frigorífico com aumento no rigor de suas análises e melhoria no controle dos frigoríficos”. Burnier chama a atenção para o caso do Masterboi, o frigorífico com a maior redução de irregularidades entre a primeira e a segunda auditoria, momento em que também houve a troca de prestador de serviço.
O estudo aponta para a importância das empresas de monitoramento contratadas pelos frigoríficos para evitar a compra de animais com origem de propriedades ‘não conformes’, mesmo sendo a responsabilidade pela compra totalmente atribuída aos frigoríficos. Para Armelin, “o desempenho dos frigoríficos já está sendo avaliado e o próximo passo deveria ser a avaliar também as empresas prestadoras de serviços de geomonitoramento, dada a grande relevância que desempenham nas políticas e práticas de responsabilidade socioambiental de seus clientes. Também é preciso aumentar o número de frigoríficos assinando o TAC para evitar uma competição desleal no mercado de compra de animais, alerta.
Ao final do estudo, a Amigos da Terra faz algumas recomendações importantes para a efetividade dos compromissos e aprimoramento das metodologias de monitoramento e auditoria, sendo as principais:
- Adoção de sistemas de auditoria pelos demais estados que instituíram o TAC;
- Aumentar o alcance do TAC, incluindo cada vez mais frigoríficos, ampliando o número de animais auditados;
- À exemplo do TAC, a auditoria do CPP deveria incluir procedimento para avaliar a conformidade das propriedades fornecedoras de animais, e não somente os procedimentos burocráticos de monitoramento;
- Manter um profissional nos frigoríficos que possa, regularmente, fazer análises independentes das propriedades fornecedoras para aferir os resultados apresentados pelas empresas de geomonitoramento;
- Os frigoríficos devem manter um banco de dados com o histórico de alterações do CAR de seus fornecedores até que sua validação pelo governo seja realizada.
- Criação de um grupo de representantes da sociedade-civil organizada para auxiliar na elaboração do termo-de-referência da auditoria no âmbito do CPP e colaborar com a análise dos resultados.
“Acreditamos que há necessidade de ampliar o alcance do conceito de auditoria e estabelecer sistemas participativos de avaliação do desempenho de empresas que possuem grande nível de externalidades sendo produzidas, como é o caso das organizações no setor da pecuária e carne bovina, e que os atores relevantes do setor pecuarista devem se dedicar à construção de um sistema de avaliação e classificação das empresas de geomonitoramento que prestam serviços para os frigoríficos”, conclui o diretor do Amigos da Terra.
Sobre o TAC e o CPP – A fim de se encontrar uma solução para os desmatamentos advindos da pecuária, várias propostas estão sendo implementadas, desde o Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), uma iniciativa do Ministério Público Federal (MPF), até o Compromisso Público da Pecuária (CPP), um protocolo voluntário iniciado pelo Greenpeace. Em 2009, algumas empresas do setor assinaram o “TAC da Carne” e/ou o CPP, a partir dos quais se comprometem a não comprar animais criados em propriedades que não estejam em conformidade com as leis ambientais e sociais.
De uma forma geral, esses compromissos exigem que as empresas verifiquem se as propriedades destinadas à pecuária com as quais negociam realizam desmatamento, se apresentam embargos do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) ou Órgãos Estaduais de Meio Ambiente (OEMAs), se nessas propriedades há sobreposição com unidades de conservação e/ou terras indígenas e se elas utilizam de mão de obra em situações análogas à escravidão, entre outras irregularidades.
Sobre Amigos da Terra – Amazônia Brasileira atua na promoção de interesses difusos, tais como direitos humanos, cidadania e desenvolvimento, a partir da valorização do capital natural. Atua nas políticas públicas, nos mercados, nas comunidades locais e no mundo da informação, por meio de atividades inovadoras com foco prioritário, mas não exclusivo, na região amazônica.